O Espírito Santo não respeita seus escritores

Francisco Aurélio Ribeiro

Não foi à toa que Saul de Navarro, Mendes Fradique, Rubem Braga, Danuza Leão, Carlinhos Oliveira, Viviane Mosé e Elisa Lucinda, dentre muitos outros, deram tchau e bênção para o nosso estado e não voltaram, a não ser para visitar, às vezes. Não vale a pena ser escritor capixaba, publicar livros aqui e não ser reconhecido. E o único reconhecimento que um autor deseja é ser lido. Há alguns escritores que fazem até pequenas tiragens, cinquenta ou cem exemplares, para distribuir aos amigos, certos de que, pelo menos por eles, serão lidos. Às vezes, nem isso acontece. Bernadette, com dois tês, gente, já escreveu sobre isso, aqui: há mais gente escrevendo do que lendo. Meu reino por uma resenha, afirmam outros. E não adianta criarem “Dia do Escritor Capixaba”, “Medalha ou Comenda Rubem Braga” e outros que tais, tudo isso  é vaidade, pura vaidade. Homenagens não pagam boletos, não é, Mara Coradello?

Pois é, esse preâmbulo foi só pra dizer que a frase do título não foi dita por mim, mas por Paulo Zucheratto, capixaba que foi pra São Paulo e lá criou a Editora Nova Alexandria, que resiste a duras penas, nestes tempos em que livro virou produto de nenhuma utilidade em tempos obscuros. E conto por quê.  Em 2009, fui procurado por ele e Rosa, sua sócia, com um projeto sobre livros de autores capixabas sobre o Espírito Santo. Pediram-me que convidasse escritores conceituados para escreverem histórias capixabas para o público leitor infantojuvenil. Assim o fizemos. Eu, Luiz Guilherme Santos Neves, Neusa Jordem, Silvana Pinheiro, Wanda Neto, Marco Haurélio, dentre outros, escrevemos dez livros sobre lendas e fatos de nossa história. Os livros ficaram lindos, foram apresentados às secretarias estaduais e municipais de educação, o lançamento foi uma bela festa na Biblioteca Pública Estadual, mas, até hoje, os livros não chegaram às bibliotecas públicas porque não foram adquiridos, com raras exceções. Paulo morreu o ano passado, desgostoso, desiludido com o nosso estado e me disse o que está escrito no título desta crônica: “O Espírito Santo não respeita seus escritores”.

Outro fato desse tipo, ou até pior, pois envolve mais escritores, ocorreu em 2014, quando a Secretaria Estadual de Educação lançou o edital 046/2014, convocando escritores capixabas para inscreverem seus livros para serem selecionados e, futuramente, adquiridos para o acervo das bibliotecas públicas  escolares. Mais de 150 escritores o fizeram e 50 títulos de 50 autores foram selecionados, após análise criteriosa de equipe técnica da própria SEDU. Quando o resultado saiu, após os prazos de recurso, em novembro daquele tempo, não houve mais tempo para se proceder ao processo licitatório. Esforço inútil, pois o governo seguinte, adversário do anterior, não quis nem saber de dar prosseguimento ao edital, por mais que o  tentássemos.

Amargamos mais quatro anos. Em 2019, com a volta do governador Casagrande, voltamos à carga. Conseguimos audiência com o atual secretário de Educação e fomos lá, uma representação dos escritores contemplados naquele edital, para solicitarmos que retomassem o edital e o finalizassem. Também fomos à Subsecretária Pedagógica, responsável pela área técnico-pedagógica. Ambos prometeram nos dar um retorno, mas não o fizeram, até hoje. Daquele grupo, alguns já até morreram como Sérgio Blank, Vera Maria da Penha e Jeanne Bilich, sem verem seus livros nas bibliotecas. Para nossa surpresa, soubemos que no dia 29 de junho passado, ocorreu uma tomada de preços para aquisição de acervo bibliográfico para as bibliotecas estaduais e nem um dos livros do edital 046/2014 estava na relação. Mais uma vez, fomos descartados, ignorados, desprezados ou sei lá que adjetivo usar. Há um, atual, que , talvez, possa ser usado: Mais uma vez, fomos limados. Agora, só nos resta recorrer ao Bispo, para chorar as pitangas. Já solicitamos audiência a Dom Dario. Ele, certamente, nos receberá.

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