A arte de Humberto Capai, suas fotografias, tem “muitas moradas”. Me permito escolher umas delas e saudar meus vizinhos moradores de outros domicílios. Todos nós beneficiados pela rica paisagem que Walter Firmo, no prefácio do álbum “Espírito brasileiro” chamou de paraíso. O paraíso das belezas do Estado do Espírito Santo.
No meu caso, olhando uma das fotos, me instalo no paraíso de um tempo que se debruça nos sabores imperecíveis da macarronada domingueira, na polenta quotidiana e nos restos de vinho do almoço que meu pai e o padre Foith, polonês e ex-mineiro de minas de carvão, aos domingos, tomavam em meio a ruidosas e animadas conversas.
Ali está a panela de ferro com os pés que a protegem do fogo muito alto que vem das achas esbraseadas, para garantir uma polenta de alta estirpe.
Saio um pouco pelos arredores da morada escolhida e me vejo na BR-262 onde Capai flagrou uma enorme serpente iluminada ao longo da montanha, contrastando com a fechada escuridão da noite. Esta foto me derrubou. Me senti atingido por imagem muito bela e me vi um pirralho de uns seis anos, socado no fundo do vale do Jucu, na beirada do rio, rodeado por montanhas portentosas. Passava ali uns dias de férias num local que mantinha bastante uma rusticidade original. Não havia luz elétrica e, por isso, o impacto daqueles fachos de luz lambendo as montanhas altíssimas deu, de saída, um nocaute no menino socado lá no fundo do panelão. Que seria aquilo? Explosões anunciando o fim do mundo, como no livro de folhas lustrosas que havia na estante lá de casa? Só me tranquilizei quando me explicaram que eram carros que lá no alto da serra passavam pela estrada com os faróis acesos. Não só me tranquilizei como passei a olhar fascinado aquele espetáculo de luzes que varriam o escuro das montanhas formidáveis. Agora, esse album de Humberto Capai me revela que ele também é um encantado por esse mesmo pedaço da BR-262.