Ilhas Borromeas

Ficam em frente da cidade de Stresa, norte da Itália, proximidades de Milão, no lago Maggiore.

Mas estas são informações de folheto turístico.

Conheci? Vi ou nem mesmo vi ou vi mal porque o cansaço ia vencendo e a cabeça pendia para o encosto do banco do automóvel. Mas havia uma quase sumida nesga de consciência que apelava para uma resistência quase impossível.

“ ... Ilhas Borromeas. Dormir agora?”

Dormir? Diante das Ilhas Borromeas?  

Mas de onde vinha essa necessidade de um quase heroísmo para abrir minhas pálpebras cansadas? Um súbito e inesperado sentimento de urgência diante de um acidente geográfico que até então, quero dizer, até então naquela viagem, não tinha aparecido? Tanto assim que depois do almoço em Novara, dos pratos fortes e do vinho espesso, não tinha nenhum interesse especial pelo resto da viagem. Apenas sonhava com a cama do hotel em Milão. Nesse regresso sonolento a paisagem era uma sucessão de videiras coladas em paredes de casas rústicas e vagas imagens de pessoas jogando trucco. Tudo impreciso. Não prestava atenção em nada. Ou melhor, num momento assustei-me com a velocidade do automóvel que ia a quase cento e setenta por hora e perguntei ao motorista se ele não estava correndo demais. Respondeu-me que não. As estradas por ali eram excelentes e aquela velocidade, normal para o trecho. Com a explicação me tranquilizei e voltei ao conforto de um torpor pós-prandial. Um torpor então interrompido quando o motorista me disse exatamente isso: “Aquelas lá são as Ilhas Borromeas”. Que tem isso a ver comigo, pensei.

“O quê?” - Levantou-se mais uma vez o garoto de quinze anos que mora dentro de mim e me deu um safanão.

Desculpe, desculpe. Óbvio, as Ilhas Borromeas daquele livro da Biblioteca Pública. O que dizia o livro? Não sei. A única coisa que sei é que o nome dessas ilhas mencionadas repetidamente nesse livro ficou martelando durante anos em minha imaginação como o mais belo lugar do mundo. Depois, agora percebia, as aluviões da vida levaram as ilhas para o esquecimento.

Bem, lá estão elas, pensei, esfregando os olhos. Ainda consegui ver (imaginei?) uma espécie de castelo numa das ilhas, uma bandeira no topo de um mastro. A luz da tarde escorria sobre as águas, o automóvel se afastava e o sono chegou pesado.

De regresso ao País, lembrando do episódio, pensei em ir até a Biblioteca tentar descobrir o tal livro que fala dessas ilhas. Ainda não fui. Será mesmo conveniente ir? Melhor não. Esquecer que um dia estive diante do mais belo lugar do mundo, como imaginava aquele garoto, e simplesmente dormi.   

 

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